quinta-feira, 23 de abril de 2009

Esquizoidia e Sociedade Actual por Teresa Metelo Dias

No dia 18 de Abril deste ano teve lugar o 1º Encontro da AP – Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia Psicanalítica – cujo tema foi “Esquizoidia e Sociedade Actual”. Um tema de interesse indubitável e, tal como o próprio nome indica, bem actual. Na verdade, é preocupação do mundo “psi” (e ainda bem) o estado das coisas na sociedade, até porque esse conhecimento deverá orientar estudos, abrir perspectivas e, em último caso, ajudar na prevenção do que aí vem. E é se esse mundo “psi” quer ser moderno e virado para o outro, ou seja, não ser esquizóide.
Neste Encontro as opiniões foram divergentes, o que é bom sinal, significando que o cérebro não foi só um. O tema foi analisado sob diferentes ângulos, passando pela economia, filosofia, neurologia e, naturalmente, pela psicanálise.
Ouviram-se oradores e comentadores mais pessimistas, outros mais optimistas. O Encontro foi dinâmico e interactivo, vivo e descomplexado. Houve tempo para as perguntas, comentários e partilhas de experiências e opiniões. O público aproveitou e esteve à altura. Os conferencistas agradeceram. O Encontro não foi esquizóide.
Por não ter sido esquizóide, permitiu que todos pensassem, e que pensassem livremente, como eu, que pensei, pensei livremente e gostei de pensar. Por ter gostado de pensar e sobretudo gostado de pensar o que pensei, decidi partilhar os meus pensamentos, para não ser esquizóide.
Não cheguei a conclusões brilhantes e, como em tudo o que penso, não estou certa de estar certa. Mas, daquilo que entendi como uma das partes essenciais da conferência, formei uma opinião.
Debateu-se, entre outras coisas, o “problema” das novas tecnologias, que alguns defenderam como formas de substituição de uma comunicação fisicamente próxima, com tudo de rico que ela implica, desde a comunicação não verbal (os olhares, os gestos que traduzem mil palavras), até aos próprios cheiros.
Não tenho dúvida que isso se perde, mas será mesmo que a culpa de termos tanto esquizóide nesta nossa actual sociedade se deve ao aparecimento e divulgação das novas formas de comunicação inerentes às novas tecnologias, a saber, aos chats, e-mails, fóruns, sms e outras? Eu acho que não. Eu uso tudo isso, e não me sinto mais esquizóide, nem sequer me tornei esquizóide.
No meu entender, a esquizoidia que existe na sociedade actual não é da responsabilidade das novas tecnologias. Ninguém fica esquizóide por falar no Messenger ou por conhecer pessoas em fóruns. Antes, as novas tecnologias vieram dar um palco aos desgraçados dos esquizóides que estavam votados ao tão só e apenas seu pobre mundo interno. Provavelmente criadas por esquizóides, estas novas formas de comunicação puderam-se, sim, constituir como uma porta para o mundo exterior a muita gente. Se calhar, contribuíram para que muito esquizóide fosse um pouco menos esquizóide. Esquizóides que, de outra forma, não teriam hipótese de sair da sua esquizoidia ou até de conhecer outros esquizóides (ou mesmo outros não esquizóides).
Quanto a mim, não esquizóide, estas novas formas de tecnologia facilitam-me a vida. Dão-me jeito. Inclusivamente, falo muito mais com pessoas com quem não falaria se não fosse a ajudinha destas novas formas de comunicação. Porém, seguramente, jamais poderão substituir o convívio “ao vivo”.
Assim, o que me parece é que, actualmente, a sociedade criou um lugar para os esquizóides, não criou esquizóides. É certo que tudo seria melhor se não houvesse esquizóides, sobretudo para os próprios esquizóides, mas a vida é assim. Não se terá tornado a sociedade menos esquizóide ao dar um lugar aos esquizóides?
Por isso, no meu ponto de vista, deixemos as novas formas de comunicação em paz. Não sei se há hoje mais esquizóides que antes, o que sei é que hoje eles têm certamente mais ferramentas para saírem do seu isolamento do que antes. É a minha optimista opinião (e sei que não sou a única optimista).
Mas então, qual será o problema da sociedade actual? Falou-se também em limites e regras, sobretudo na ausência destes na educação das crianças ou então na sua imposição porque sim. Falou-se na necessidade das crianças terem regras e limites mas sobretudo na importância de compreenderam a razão da sua existência. Não dar limites e regras às crianças é negligência; impô-los porque sim é maldade.
Será que é essa distorção da importância dos limites e regras nas crianças de agora o problema vigente? Não será só, mas pelo menos é um dos. O que poderá contribuir para tal, numa altura em que os princípios da psicologia infantil até não se encontram assim tão mal difundidos como isso? Aqui sim, terão um papel os pais esquizóides ou com traços esquizóides da personalidade que, muitas vezes, à defesa, se embrenham no seu mundo profissional como desculpa, ainda que inconsciente, para fugirem às relações. Aqui, alia-se a falta de jeito (para não falar em incapacidade) destes pais em se relacionarem criativamente com os seus filhos (o que lhes permitiria contar “uma história” sempre que as regras são impostas) à mera falta de tempo que os conduz a impor e pronto, “que a mãe tem mais que fazer”. E é assim.
Serão também estes pais que apostam cegamente na eficácia dos filhos, pois que se não fossem esquizóides vê-los-iam como eles são e não como gostariam que eles fossem, já que estariam voltados para o outro e não para si próprios. Encharcam-nos de actividades para preencher, como muito bem se disse no Encontro, os “tempos mortos”, e regozijam-se das habilidades novas dos seus filhos. Também aqui a sociedade adaptou-se a estes pais esquizóides, criando esta multiplicidade de actividades para que os filhos de esquizóides tenham “com que se entreter”…
Sendo sempre recompensados pela eficácia em vez de pela espontaneidade e criatividade, que será destas crianças? Novos esquizóides? Provavelmente… Agora não me venham cá dizer que a culpa é do Messenger.
Teresa Metelo Dias

terça-feira, 21 de abril de 2009

Arte e Psicologia


Em 1533 o embaixador francês Jean de Dinteville encomendou ao pintor alemão Hans HOLBEIN o duplo retrato dele próprio e de Georges de Selve. Esta obra, talvez a mais conhecida de Holbein, é referida por Julia Kristeva numa entrevista de 1993. Nela Kristava diz apreciar muito Holbein. E diz também que todoos os retratos de Holbein são de pessoas deprimidas. Kristeva liga a depressão a uma ferida narcísica antiga que terá a ver com a impossibilidade, numa fase muito inicial da infância, de a mãe constituir um objecto.

Revejam a pintura de Holbein e os dois homens que nela figuram, conhecidos pelos “Embaixadores”. A forma oblonga, em baixo, será a de um crâneo – a lembrar a transitoriedade da vida e a inevitabilidade da morte.
Os dois homens representados têm 25 e 29 anos! Não sei o que impressiona mais, se os objectos que os rodeiam e que comunicam o amplo leque de interesses destes dois homens da Renascença, se o ar pesado, de uma gravitas que só vemos hoje em dia em pessoas de uma idade (muito) madura. Sabemos que, nos nossos dias, a adolescência se prolonga cada vez mais, nalguns casos para lá dos 30…

Clara Pracana